quarta-feira, 24 de maio de 2023

 Hoje parei muito para pensar sobre as coisas que tenho na minha vida nesse momento. Acho que passei muitos dos últimos dias (ou meses?) só pensando nas coisas ruins que eu gostaria de mudar. Isso formou uma ~nuvem que não chove~ sobre a minha cabeça, escondendo de mim mesma o brilho do sol. E eu tenho muitos sóis na minha vida. Sóis que admiro e me iluminam com sua existência. O mundo não vai bem, os dias não são fáceis, mas poder estar vivendo esses dias com essas estrelas luminosas me transborda o sentimento de honra. Ancorados no amor mais puro e verdadeiro. E por isso sou grata por viver cada dia.

Que bom poder chorar de amor...
Que bom poder estar viva...


Vanessa Cristina Martins
19/05/23

segunda-feira, 10 de maio de 2021

 Mesmo que só passou por aqui, no coração tu me cabe bem. Mas não cabe mais na cabeça, não nos pensamentos. É preciso silenciar.  A incansável espera da tua chegada só é bonita em um poema. Na vida real, manter o olhar na esquina esperando você chegar é desgastante, inquietante. A depender de como a lua está agindo sobre mim, eu até fico feliz imaginando o momento em que você vai passar pela porta. É excitante. Mas em segundos eu lembro que isso só está na minha cabeça. Você só está na minha cabeça. Mas não cabe mais. Eu quero só te guardar no coração. Onde tu me cabe. Aqui dentro, bem quentinho. Pra quando (se) tu chegar, eu te receber com a cabeça leve e livre de só te imaginar. O que eu quero é (te) sentir.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

por que a gente tende a evitar o que ainda não conhece? por que quando o escondido mostra o rosto, a gente desvia o olhar? finge que não é com a gente, e foge até aguentar? a sombra de tudo o que não se conhece, assombra o sentido de segurança em nós. congela, desarma e nos põe em estado de choque. é xeque-mate. embate, dentro. ando beirando o desconhecido estranho das entranhas de mim. vivo encarando o escuro no escuro do não saber. e uma coisa, posso dizer. o que você não conhece, tem algo a te oferecer. o que você evita, ainda vai te surpreender. e o que te sufoca de medo, tem um novo você, pra você.


- Tati Rossi

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Como alguém que abraça
o inalcançável
aceito a tua ausência.
Não estar em nada 
além de em meus poemas.
Eu também apenas estou
quando aqui escrevo
e nem então.
Nesse encontro de ausências
contemplando a completude de vazios
te bebo só pra fazer-te parte
de algo além desse emaranhado de nadas.
Somando as faltas e ausências
obtenho o saldo positivo
de um ou outro poema
meia-boca
inteiro coração.
 Dia desses me peguei escrevendo pra você um poema triste
Falava sobre como dói essa saudade e essa distância
Também outro dia desses me peguei 
Lembrando você dizer que a saudade é linda
Ela só dói porque é uma coisa boa, você falou
E foi aí que eu senti e percebi
Até mesmo a saudade é luz
Dentre tantas lembranças
Ela me faz pensar em você
E pensar em você é sentir essa imensidão de amor
É sentir essa conexão, meu bem, que eu não canso de dizer que é de alma
Te pensar e sentir parte de mim 
É me sentir inteiramente eu inteira
Te amo daqui, te amo forte e te amo sempre.


 Não tentar concluir. Só isso é importante. Seguir implacável numa construção onde tudo o que está vivo e pulsa é gestado pela incerteza - o que se gera aí é de valor inestimável. Conduzir-se para dentro da vida. Habitar o corpo e dar a si mesma, a cada instante, o lugar que lhe corresponde. Concentrar-se, ter paciência para aprender o amor  profundo com o tempo. Não colocar finalidade no movimento mas perguntar-se sobre o caminho do movimento. Sobretudo confiar, pois tudo forma uma rotação luminosa.


- Laura Berbet

domingo, 1 de novembro de 2020

Porque tinha sal em minhas pestanas, porque existe um salmão dourado onde o amor sempre dança, porque a ideia de ir até o mar de metrô era a oração que nos fazia ficar acordados até de manhã, porque há um osso se estilhaçando constantemente dentro das paredes mestras e nós já sabíamos isso, porque a paixão não é de todo a coisa mais importante mas é sim o canudinho através do qual dá para ver que o mundo é muito feito de construções de papel - celulose que vem da árvore e que depois se transforma em lista telefônica de onde alguém arranca a página e logo transforma em veleiros e montanhas. Talvez porque na porta do restaurante habitual alguém toca clarinete ao sol, porque até as ruínas podemos amar nesta cidade, porque eu tenho um olho em você e você tem um dedo em mim, porque para chegar no telhado do aqueduto é preciso percorrer a estreita escadaria de pedra e é impossível não esfregar as costas nas paredes úmidas. Porque atingir o ponto de rebuçado significa simplesmente abandonar todas as coisas e dedicar-se só à concentração, mesmo que todas as coisas sejam um olho preto e um olho castanho e sua dissociação seja a possível causa para a avalanche. Porque a palavra Bushboy não existia até aqui mas agora sim, porque fazer equilibrismo sobre a corda amarela dentro do apartamento é tudo o que já imaginávamos que ia ser, mesmo antes de acontecer. Porque no interior do pulmão do cervo tem a carne que brilha, brilha tanto como o sol que se espelha na ponta da seta. Porque acreditamos, você e eu, que a razão final é que a erva cresça muito acima de nossas cabeças.


- Matilde Campilho.

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

O dorso da baleia solitária

Segundo Bukowski, o amor acontece a cada dez anos
Você me falou
Precisamente o que você me disse foi O amor acontece a cada dez anos E eu acabo de chegar aos dez I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Eu te lembrei do jantar Do meu cabelo E da forma como o teu corpo se movia ao redor do meu Eu gostava de acreditar que você sabia o que estava fazendo Que os movimentos bruscos, rápidos e certeiros Remetiam a algo como certeza, domínio e qualquer coisa similar ou mesmo igual a segurança. Eu tenho vergonha Foi a primeira coisa que você me falou Eu tenho vergonha de tudo I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Imagine se fosse seguro Respondi certeira Neste exato momento eu embarquei Em direção ao poço sem nome Porque algumas coisas não tem nome E outras a gente só não sabe I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Por falar em jantar Foi lá que eu conheci o menino nômade de oito anos Que me recitou um poema: Quando você se afastar, Faça devagar e suavemente Faça como se eu estivesse morrendo No meu sonho em vez da minha vida. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito As mensagens não paravam de chegar E o meu medo você viu como charme Se você se comportar, te levo café da manhã na cama Você me falou Você terá que ler a minha autora preferida Eu te disse I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Enquanto você me apresentava os homens da sua vida Eu te cobria com os abismos das minhas mulheres Não espere para ter certeza, mexa-se mexa-se mexa-se E eu achava que você sabia do que eu estava falando I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Você gosta do amargo. Você me falou. Gosto do que se despe e te despe Independente do sabor. Eu te respondi. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Eu te comprei um livro vermelho Comecei a grifa-lo quase que secretamente Porque eu sabia que só o entregaria no fim E vieram os desenhos, as escritas e todo o peso do meu corpo Era pra você o livro Depois eu soube que você achava um sacrilégio modificar a obra original Mas era pra você o livro despido Cada um pode mudar de opinião a hora que quiser. Você me falou I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Tua voz é boa, segura. Eu gosto. Você me falou I wanna hold your hand Eu deveria ter dito No poço sem nome Pude tocar os minutos do teu tempo Eles pairavam no ar E o brilho da pausa me desestruturava Acho que foi isso que me manteve por perto Dança comigo? Você me perguntou I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Eu não sei dançar a dois Respondi Deixa que eu te conduzo Você me falou I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Aos vinte e sete anos eu gostava de explicações Não de entendê-las, mas de possuí-las Eu não sou bom para explicar as coisas Você me falou Mas eu sou boa de entender Eu respondi. Eu sou estranho. Você me falou. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Por um breve instante eu saí do poço sem nome E foi sem suavidade e rápido demais que eu te avisei Isso tem um fim Não sou homem pela metade Você me falou I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Tenho problemas em dormir junto Eu te disse Tenho aqui uma escova de dente nova Você me falou I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Você me estendeu um contrato Um contrato de que eu poderia ir embora A hora que eu quisesse Mas que, Sem dúvidas, Você protegeria o menino nômade Mesmo que pra isso tivesse que ir embora antes E eu grifei no livro vermelho Sobre os leões que rugem contra Deus Quando percebem que seus focinhos são iguais. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Tempo Tempo é uma coisa que eu não entendo Mas eu respeito Só me diga quando E você se segurou nos teus trinta anos de idade me garantindo clareza I wanna hold your hand Eu deveria ter dito De volta ao poço sem nome Eu descompassava Como se aquilo fosse eu Também quero te ver, acredite. Você me falou I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Soube de um poema cujo verso dizia: Que coisa mais linda esse ácido despenteado, caramba. O ácido é o desoxirribonucleico, DNA ou simplesmente, sangue. Eu acho o meu sangue vermelho demais. Eu te disse. Você me abraçou. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Eu não acredito nesse fim. Você me falou. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito E depois disso eu caí em outro poço Esse tem nome E eu sei o nome Mas não quero falar aqui I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Numa esquina qualquer No tempo exato A vida gritou para eu sumir Eu grifei no livro vermelho: Não sou de choro fácil. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Quer ir ao parque? Eu te perguntei. Vou num tempo diferente do seu. Você me respondeu. E eu perguntei se esse era o fim. Os cachorros me deram uma direção na vida incrível. Você me respondeu. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Num passado próximo Rebobinando apenas alguns dias Eu me gravei dançando sozinha pra você Ao meu lado, uma taça de vinho Ao seu lado, você escancarou ao mundo, feliz, o encontro de duas As minhas células ressoaram uma dor intangível O contrato sempre foi de desapego e eu não te devo nada Você me falou E eu entendi que a baleia era eu. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Então eu abri a porta da memória E me vi sentada na cama preta Com o coração acalentado Ao ver raízes nos seus olhos e excitação Não tenho pressa em te conhecer. Você me falou. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Essas coisas acontecem assim, inesperadamente. Você me falou Não se engane, você sabia que havia chegado aos dez. Eu deveria ter dito. Eu não sei quantas vezes eu te vi nua Você me falou Acho que nenhuma Eu deveria ter dito. Não dou chance ao azar. Você me falou. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Minha mãe não teve contrações durante a minha gravidez. É falta de coragem, o médico falou

Nesses casos específicos, o bebe permanece durante alguns dias a mais no útero.
Durante este tempo, desenvolve um canal ligando o osso que eu não sei o nome que fica no extremo da cabeça
com o outro osso que eu não sei o nome e que fica no extremo do calcanhar esquerdo.
O canal atravessa o dorso e move a baleia.
A falta de coragem é recompensada por um subterfúgio para sentir.
E ela sente tudo.
Ela é um canal e um canal é sempre atravessado. I wanna hold your hand Eu deveria ter dito Eu prefiro ser a garota Ou a baleia Que tem um canal nas costas E que te escreveu um poema. Porque eu gostaria de segurar a sua mão, nada mais.

- Cassiana Maranha